Mestre Dogen (1200-1253)

Na meditação tu próprio és o espelho que reflecte a solução dos teus problemas. O espírito humano tem liberdade absoluta no interior da sua verdadeira natureza. Podes atingir a liberdade intuitivamente. Não trabalhes para a liberdade, deixa que a prática seja ela mesma libertação.

Leonardo Boff

Ciência e Espiritualidade

É de Einstein a frase:"a ciência sem religião é manca, a religião sem a ciência é cega". Com isso queria dizer que a ciência levada até a sua exaustão termina no mistério que produz assombro e encantamento, experiência típica das religiões. A religião que não se abre a este mistério das ciências deixa de se enriquecer, tende a se fechar em seus dogmas e por isso fica cega. A ciência se propõe explicar o como existem as coisas. A religião se deixa extasiar pelo facto de que as coisas existem. O que é a matemática para o cientista é a oração para o religioso. O físico busca a matéria até a sua última divisão possível, os topquarks, chega aos campos energéticos e ao vácuo quântico. O religioso capta uma energia inefável, difusa em todas as coisas até em sua suprema pureza em Deus.

Ciência e religião se perguntam: O que se passou antes do Big Bang e do tempo? Muitos cientistas e religiosos convergem nesta compreensão: Havia o Mistério, a Realidade intemporal, no absoluto equilíbrio de seu movimento, a Totalidade de simetria perfeita e a Energia sem entropia.

Num " momento" de sua plenitude, Deus decide criar um espelho no qual pudesse ver a si mesmo. Cria aquele pontozinho, bilionesimamente menor que um átomo. Um fluxo incomensurável de energia é transferido para dentro dele. Aí estão todas as possibilidades. Potencialmente todos nós estávamos lá juntos. De repente, tudo se inflacionou e depois explodiu. Surgiu o universo em expansão. O Big Bang, mais que um ponto de partida, é um ponto de instabilidade que no afã de criar estabilidade, gera unidades e ordens cada vez mais complexas como a vida e a nossa consciência.

O Princípio de auto-organização do universo está agindo em cada parte e no todo. Neste universo tudo tem a ver com tudo, formando uma incomensurável rede de relações. Deus é a palavra que as religiões encontraram para esse Princípio, tirando-no do anonimato e inserindo-no na consciência. Para defini-lo não há palavras. Por isso, é melhor calar do que falar. Mas se tudo é relação, então não é contraditório pensar que Deus seja também uma relação infinita e uma suprema comunhão.

Ora, esta idéia é testemunhada pelas tradições religiosas. A experiência judaico-cristã narra continuamente as relações de Deus com a humanidade, um Deus pessoal que se mostra em três Viventes: o Pai, o Filho e o Espírito Santo.
O ser humano sente esta Realidade em seu coração na forma de entusiasmo (filologicamente significa ter um deus dentro). Na experiência cristã, diz-se que Ele se acercou de nós, fez-se mendigo para estar perto de cada um. É o sentido espiritual da encarnação de Deus em nossa miséria.

A ânsia humana fundamental não reside apenas em saber de Deus por ouvir dizer, mas em querer experimentar Deus. Atualmente, seria a ecologia profunda, a que cria o melhor espaço para semelhante experiência de Deus. Mergulha-se então naquele Mistério que tudo penetra e tudo sustenta.

Mas para aceder a Deus, não há apenas um caminho e uma só porta. Essa é a ilusão ocidental, particularmente das igrejas cristãs, com sua pretensão de monopólio da revelação divina e dos meios de salvação. Para quem um dia experimentou o Mistério que chamamos Deus, tudo é caminho e cada ser se faz sacramento e porta para o encontro com Ele. A vida, apesar de suas muitas travessias e das difíceis combinações da dimensão dia-bólica com a simbólica, pode então se transformar numa festa e numa celebração. Ela será leve, porque carregada da mais alta significação.

Respirar com naturalidade - Parte II

H. Ribera elaborou, no seu estudo "Errando para um sentido", uma síntese de cinco níveis de consciência: sensorial, individual, pessoal, cósmica e eterna.
Sistematizou cinco estádios de crescimento, expressando-os como dependência, independência, interdependência,comunhão e solidariedade universal. Estes cinco estádios de crescimento equivalem a cinco níveis da vida humana: pré-individual ou massificada, individual ou autoafirmada, interpessoal ou relacionada, transpessoal ou expandida, e transtemporal ou transformada.
No primeiro estádio, ou de vida massificada, fica dissimulada a pergunta para se chegar a ser a si próprio, e não se sai da opacidade.
No segundo, da vida individualizada, a afirmação de si encerra-se num eu que impede, por excesso de egoísmo, chegar ao autêntico de si mesmo.
No terceiro, da vida relacionada, a pessoa abre-se e alarga o horizonte de si mesmo, saindo de si para outras pessoas.
No quarto, da vida expandida cosmicamente, aumenta a amplitude do horizonte da saída de si, extendendo o eu próprio para o universo inteiro.
No quinto, da vida transformada, ocorre o que o místico Eckhart formulava dizendo que, quanto menos alguem é, mais Alguem há.

Juan Masiá, SJ em "El otro Oriente - Más allá del diálogo"

Respirar com naturalidade - Parte I

O filósofo que se questiona o quê ou quem é o ser humano, tem algo em comum com o psicoterapeuta, que tenta ajudar outro ser humano ajudar-se a si mesmo a encontrar-se. Ambos coincidem em iluminar um caminho que nunca se acaba de percorrer e ao mesmo tempo convidando a caminhar por ele; mas percorre-lo depende de cada um.

Escreve atinadamente Hermam Hesse na introdução do seu romance DEMIAN:
" A vida de um indivíduo é uma caminhada em direcção a si mesmo, a procura de um rumo, o esboçar de um trilho. Jamais alguem, em momento algum, conseguiu tornar-se coerente com o seu interior; contudo, todos aspiram a alcançar essa harmonia. Quer a procurem com menor habilidade, quer persigam esse ideal com perspicácia, cada qual realiza-o conforme pode, mas todas as pessoas arrastam consigo e até ao fim restos do seu nascimento, mucos e membranas de um mundo primevo. Há quem nunca chegue a tornar-se num ser humano e permaneça rã ou lagarto ou então formiga. Há quem seja pessoa por cima e peixe por baixo. No entanto, cada indivíduo é uma criação da natureza em ordem ao homem. Procedemos de uma só origem - a mãe - e provimos da mesma embocadura; mas, seja qual for a pessoa, ela procurará elevar-se do abismo em direcção ao seu destino. Sabemos entender-nos mutuamente, mas somente cada qual tem capacidade para interpretar a sua própria vida."

Juan Masiá, SJ em "El otro Oriente - Más allá del diálogo"

Domingos Cunha


Meditação Cristã – uma oração integradora
Autor: Domingos Cunha, CSh

NOVA OBRA INTRODUZ E ENCORAJA AS PESSOAS À PRÁTICA DA MEDITAÇÃO

Em um mundo onde as pessoas vivem apressadas, estressadas, bombardeadas de informações a todo o tempo e de todos os lados, a busca por um momento de paz e descanso se faz cada vez mais necessária. Reabastecer-se de energias positivas tem sido a busca de muitas pessoas, que aproveitam para, por meio da oração, relaxar e elevar-se espiritualmente.
Meditação Cristã – uma oração integradora é o lançamento que certamente impulsionará o leitor a adotar essa prática diária de união e intimidade com Deus, além de trazer paz e tranqüilidade à alma. Conforme afirmou Dostoievski, “todo homem carrega dentro de si um vazio do tamanho de Deus”. A presente obra, justamente, vem ao encontro daqueles que desejam preencher esse vazio.

Resgatar e difundir o significado da meditação cristã foi a missão do monge inglês John Main, nascido em Londres em 1926. Pertencente à Ordem de São Bento, ao estudar os escritos do monge João Cassiano (séc. IV) e de outros contemplativos conhecidos como “Padres e Madres do deserto”, ele descobriu a conecção entre a repetição e interiorização de frases ou versículos da Bíblia — presente na tradição monástica cristã — e a forma de meditação que aprendera no Oriente, por ocasião de sua experiência espiritual na Malásia com um swami (monge indiano), quando ainda não era religioso beneditino.
Graças à profundidade e à riqueza dessa maneira de rezar, os adeptos da meditação cristã foram crescendo e, hoje, há vários centros de Meditação Cristã e grupos de oração semanal em diversas partes do mundo. Após a morte de Dom John Main em 1982, outro beneditino inglês, Dom Laurence Freeman tornou-se o seu sucessor e começou a viajar por todo o mundo, ensinando a meditação por meio de retiros, palestras e encontros de oração.

De maneira simples e completa, Domingos Cunha, introduz o leitor à fascinante realidade da meditação. Ao longo dos quatorze capítulos que constituem o livro, Cunha começa apontando a necessidade da oração, os significados do termo “meditação” e também um pouco da história da oração monástica e também a importância de alguns escritos que surgiram das experiências espirituais e místicas de personagens importantes da Igreja.
Após constatar os preciosos esclarecimentos a respeito da diferença entre meditação e reflexão, o que é peculiar à meditação cristã e à meditação oriental, as dificuldades que o praticante encontrará e os frutos desta prática, o leitor certamente se sentirá impelido a provar a meditação cristã em sua vida e testemunhar sua experiência.
“A meditação se configura como um tipo de oração que integra as várias dimensões da pessoa: física, energética, emocional, psíquica, racional, espiritual (...) Sem dúvida, é um jeito de rezar muito significativo para o nosso tempo, que anseia por perspectivas mais holísticas na compreensão do ser humano”, afirma Domingos Cunha.

Domingos Cunha, padre da comunidade Shalom, nasceu em Portugal em 1963 e chegou ao Brasil em 1985. Completou os estudos teológicos no Instituto Teológico-Pastoral do Ceará (ITEP), onde foi coordenador do curso propedêutico e professor de Mistério de Cristo, atualmente assume as matérias de teologia da vida religiosa e espiritualidade. Ordenado sacerdote em 1988, tem dedicado sua vida preferencialmente à evangelização da juventude, assessorando cursos e outros encontros nas áreas de formação humana, de vivência e aprofundamento da fé, de ecologia e de capacitação técnica e pedagógica na linha da educação libertadora no Ceará, em Minas Gerais e em Portugal.

Quem tem vergonha de falar de perdão?

Evangelho segundo S. Mateus 18,21-35.

Então, Pedro aproximou-se e perguntou-lhe: «Senhor, se o meu irmão me ofender, quantas vezes lhe deverei perdoar? Até sete vezes?» Jesus respondeu: «Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete. Por isso, o Reino do Céu é comparável a um rei que quis ajustar contas com os seus servos. Logo ao princípio, trouxeram-lhe um que lhe devia dez mil talentos. Não tendo com que pagar, o senhor ordenou que fosse vendido com a mulher, os filhos e todos os seus bens, a fim de pagar a dívida. O servo lançou-se, então, aos seus pés, dizendo: 'Concede-me um prazo e tudo te pagarei.’ Levado pela compaixão, o senhor daquele servo mandou-o em liberdade e perdoou-lhe a dívida. Ao sair, o servo encontrou um dos seus companheiros que lhe devia cem denários. Segurando-o, apertou-lhe o pescoço e sufocava-o, dizendo: 'Paga o que me deves!’ O seu companheiro caiu a seus pés, suplicando: 'Concede-me um prazo que eu te pagarei.’ Mas ele não concordou e mandou-o prender, até que pagasse tudo quanto lhe devia. Ao verem o que tinha acontecido, os outros companheiros, contristados, foram contá-lo ao seu senhor. O senhor mandou-o, então, chamar e disse-lhe: 'Servo mau, perdoei-te tudo o que me devias, porque assim mo suplicaste; não devias também ter piedade do teu companheiro, como eu tive de ti?’ E o senhor, indignado, entregou-o aos verdugos até que pagasse tudo o que devia. Assim procederá convosco meu Pai celeste, se cada um de vós não perdoar ao seu irmão do íntimo do coração.»

Comentário ao Evangelho feito por São João Crisóstomo (c. 345-407),
Homilias sobre S. Mateus, nº 61

«Perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido» (Mt 6,12)
Cristo pede-nos portanto duas coisas: que condenemos os nossos pecados, que perdoemos os dos outros; que façamos a primeira coisa por causa da segunda, a qual nos será então mais fácil, pois aquele que pensa nos seus próprios pecados será menos severo para com o seu companheiro de miséria. E devemos perdoar não por palavras apenas, mas «do fundo do coração», para que contra nós não se vire o ferro com que pensamos bater nos outros. Que mal te pode fazer o teu inimigo, que seja comparável àquele que a ti próprio fazes? […] Se te deixas chegar à indignação e à cólera, serás ferido não pela injúria que ele fez contra ti, mas por esse teu ressentimento.

Portanto não digas: «Ele ultrajou-me, caluniou-me, fez-me coisas miseráveis.» Quanto mais disseres que te fez mal, mais mostras, afinal, que te fez bem, pois deu-te ocasião para te purificares dos pecados. Assim, quanto mais ele te ofender, mais te põe em estado de obteres de Deus o perdão para as tuas faltas. Porque, se nós quisermos, ninguém nos poderá prejudicar; e até os nossos inimigos nos prestarão assim um grande serviço […] Considera portanto a vantagem que retiras das injúrias, se as sofreres com humildade e mansidão.